Igreja Católica com inusitada dupla fachada em São Leopoldo, RS.
Euríalo, o congadeiro mais erudito que esse mundo já conheceu, quando me encontra, sempre é simpático. Se demoramos uns minutos na conversa, porém, logo se lembra de meu posicionamento religioso e brinca:
- Você está estudando para combater o Santo Padre! É da oposição!
Então, em tom de brincadeira, respondo:
- Não, não estou me preocupando em combater nada não, porque os próprios padres já estão fazendo besteiras eles mesmos.
Daí, é o próprio Euríalo que menciona algum episódio triste noticiado na TV sobre padres pegos em atos de pedofilia ou dirigindo bêbados.
Esses fatos tristes de que nos lembramos são realmente repugnantes. O Euríalo parece se entristecer de ver pessoas cometendo essas perversidades dentro de sua igreja. Eu, por minha vez, me entristeço por pensar que alguém que um dia decidiu servir ao próximo o ameaça de forma tão grotesca.
- Esses padres... - Diz Euríalo pensativo.
Mas outros padres fazem ainda mais coisas que esses. E são coisas boas, dignas de menção, embora não passem pelos critérios de noticiabilidade de nossa mídia. Um exemplo mais publicamente reconhecível seria o de Doroty Stang, que só se fez reconhecer pelos donos das câmeras quando protagonizou como vítima uma cena do tipo que gostam de mostrar. Mas quero apresentar outros exemplos, mais próximos de mim, mais meus.
Foi em Julho 2010, durante o congresso da SOTER - Sociedade Brasileira de Teologia e Ciências da Religião, na PUC-Minas. Três padres me surpreenderam. O primeiro foi Dom Antônio Celso Queiroz. Ele leu trechos de um documento assinado após a segunda guerra (quando se revelou de modo inegável o massacre nazista) por diversas igrejas evangélicas alemãs. No documento, as igrejas pediam perdão e diziam que, se tivessem sido mais fervorosas em sua fé, teriam combatido o regime. Então, Dom Antônio disse com voz triste: "Infelizmente, a Igreja Católica [Romana] não assinou o documento.". Sua humildade me surpreendeu fortemente.
Já no segundo dia do congresso, quem me chamou a atenção foi o padre e professor Leonardo Agostini. Antes de entrarmos para a sala em que se reunia o GT sobre "A Bíblia e suas leituras", conversamos um pouco sobre o campus da PUC, sobre generalidades das cidades grandes etc. Pessoa simples, comum. Mas, logo no início de sua apresentação, surpreendeu a todos com um comentário que observava que nenhuma oração havia sido feita desde o início do evento. Convidou-nos, então, a ler em oração o Salmo que ele comentaria (Salmo 42, com tradução pessoal sua). Acho que pela primeira vez entendi o que se entende por leitura orante da Bíblia. Graças ao padre Agostini. Vamos, pois, à terceira surpresa.
Durante a aprentação do referido padre, entrou na sala o padre jesuíta Johan Konings e se assentou perto de mim. A apresentação seguinte seria a minha. Mas o professor Valmor da Silva, coordenador da mesa, comentou antes: "E olha que honra, Leonardo, o padre Konings entrou na sala durante sua apresentação!" Ao que Leonardo disse: "É... eu tremi um pouco, mas aguentei firme." (Explicação para os que não reconhecem o nome: padre Konings, professor da FAJE, é um dos mais respeitados biblistas da Igreja Católica Romana na América Latina. Sempre é convocado quando o assunto é tradução da Bíblia e algo do tipo.) Bom, imaginem só minha situação. Eu tinha que dirigir-me à mesa com esse sujeito lá desde o começo. Fui, claro. Enquanto lia meu texto, a surpresa. Padre Konings se levantou e se dirigiu à porta. Pensei: "Não gostou, já vai embora...". Não, ele não foi embora. Fechou a porta porque vinha ruído lá de fora. Voltou e se sentou onde estava antes. Escutou até o fim e, quando voltei a posicionar-me perto dele, perguntou sobre a instituição em que eu estudava e, simpático, disse que deveríamos nos encontrar em breve, pois conhecia meu orientador e estava preparando um evento com ele. O evento não aconteceu ainda. Não nos encontramos de novo. Mas seu simples gesto de fechar a porta e atentar para palavras de tão reles estudante me impressionou muito.
Essas atitudes não foram noticiadas, nem poderiam ser, já que são pequenas, simples, desprezíveis segundo o mundo do espetáculo em que vivemos. Mas, sem dúvida, foram notadas por alguns. E, para mim, foram três testemunhos de humildade e sabedoria vindos de três padres que honraram suas escolhas.
Abraços fraternais a padres como esses, dos quais discordo em questões pontuais, mas que respeito profundamente, por sua integridade e sincera devoção ao Eterno.
P.S. Tenho que comentar isso com o Euríalo.
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